Apagão: um sinal que vai muito além da falta de luz

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O apagão que recentemente deixou boa parte de Portugal às escuras trouxe mais do que simples transtornos técnicos: revelou fragilidades invisíveis na forma como vivemos em comunidade. As corridas aos supermercados, o receio do desabastecimento e a ansiedade generalizada mostraram que, por trás da fachada de normalidade, existe um nervo exposto — o medo de ficar sem.

Quando a energia falha, o que mais rapidamente se apaga não são as luzes, mas a sensação de segurança coletiva. Em poucos minutos, vizinhos que partilham o elevador todos os dias tornam-se concorrentes por garrafas de água e pacotes de arroz. A tecnologia falha e, com ela, falham também muitos automatismos sociais que, no dia a dia, mantêm a ordem. Esta crise revelou algo profundo: o quanto dependemos, não apenas da infraestrutura elétrica, mas também da confiança invisível que sustenta a vida em comunidade.

O verdadeiro colapso não é elétrico — é humano. Não é a ausência de energia que nos paralisa, mas a ausência de confiança e cooperação. Quando o medo se instala, as regras da boa convivência tendem a desmoronar-se com uma rapidez assustadora.

Na QUOR, acreditamos que momentos como este devem servir de reflexão. Não basta garantir direitos individuais se, no momento da crise, esquecemos o dever de comunidade. A verdadeira segurança nasce da responsabilidade partilhada, da capacidade de agir com serenidade quando a corrente falha — e não apenas da exigência quando tudo corre bem.

O apagão foi um lembrete: a luz é importante, mas a coesão social é essencial. Sem ela, mesmo o sistema mais avançado se torna vulnerável. Talvez seja tempo de investir, não apenas em infraestruturas mais resilientes, mas também em comunidades mais conscientes e solidárias.

É nos momentos de falha que se testa a verdadeira solidez de uma sociedade. E uma sociedade justa não se mede apenas pelos direitos que proclama nos seus códigos legais, mas pela capacidade de viver, com humanidade, a interdependência invisível que nos liga. O Direito não é apenas um conjunto de normas: é, acima de tudo, uma expressão da forma como nos comprometemos uns com os outros.

Que cada falha de luz nos recorde que, no fim, o que verdadeiramente nos sustenta não é o que temos — é quem somos juntos. E que, mesmo no escuro, é possível agir com luz interior.

Margarida Antunes

QUOR Advogados