
Ameaças, injúrias e difamação: o que é crime e o que não é?
É cada vez mais comum ouvir expressões como “vou apresentar queixa” ou “isso é crime de difamação” quando há uma troca de palavras mais acalorada — sobretudo online. Mas nem tudo o que é ofensivo é, de facto, punível criminalmente. Em contrapartida, há situações em que a liberdade de expressão é usada como escudo para justificar comportamentos que a lei já não tolera.
A legislação penal portuguesa protege a honra, o bom nome e a dignidade das pessoas. Mas não o faz de forma absoluta — protege-os dentro de certos limites. A injúria (art. 181.º do Código Penal) ocorre quando alguém ofende diretamente a dignidade de outra pessoa, através de palavras ou gestos. A difamação (art. 180.º) refere-se a imputações feitas a terceiros, mesmo que ausentes, que possam afetar a sua reputação. Já a ameaça (art. 153.º) é punível quando alguém declara a intenção de causar mal grave e injusto a outra pessoa, seja na sua integridade física, liberdade ou bens.
Estes crimes são particulares ou semipúblicos consoante os casos, e nem sempre requerem prova de dolo intenso — basta que sejam ofensivos e lesivos da honra. No entanto, há nuances importantes. Chamar “incompetente” a alguém num contexto de crítica laboral pode ser mera opinião. Mas fazer acusações falsas em redes sociais, com linguagem degradante, já pode configurar crime.
O problema é que, com o crescimento das redes sociais e das aplicações de mensagens como o WhatsApp, as fronteiras entre crítica, opinião e ofensa tornaram-se mais difusas. Muitas pessoas escrevem no calor do momento, esquecendo-se de que o Código Penal também se aplica ao que é dito ou escrito online.
E atenção: a liberdade de expressão está consagrada na Constituição, mas não dá direito ao insulto ou à humilhação. A jurisprudência dos tribunais tem reforçado esta linha: a crítica é legítima, até severa, desde que não ataque a honra pessoal.
Na prática, tanto vítimas como autores devem agir com cautela. Quem se sente ofendido deve guardar provas (mensagens, capturas de ecrã, publicações) e procurar apoio jurídico antes de avançar. Quem comunica em espaços públicos deve refletir antes de publicar: a raiva de hoje pode ser o processo de amanhã.
Na QUOR, temos acompanhado inúmeros casos em que o conflito começou com palavras e terminou em tribunal. A justiça pode reparar o dano — mas a prevenção continua a ser o melhor caminho. Porque viver em liberdade é também saber quando o silêncio é mais forte do que o grito.
Paula Pratinha