A Ponte Ferroviária do rio Gadanha (Monção): Memórias de uma objetiva

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Rui Manuel Marinho Rodrigues Maia # Opinião

Licenciado em História, Mestre em Património e Turismo Cultural pela Universidade do Minho – Investigador em Património Industrial

 

As imagens entram pela nossa retina, firmando no nosso cérebro as memórias do mundo que nos rodeia. Algumas imagens, ainda que estáticas, como a imagem aqui presente, retratam o passado que, apesar de tudo, parece ter parado no tempo, mas, impiedoso, ele não para. Os créditos desta velha imagem pertencem a um fotógrafo que, amavelmente, a cedeu ao Ex.mo Sr. Paulo Ferreira, funcionário do Arquivo de Monção e, deste, para mim. E, que bela imagem da velha Ponte Ferroviária do rio Gadanha, situada na freguesia de Troporiz, que marcou de forma indelével a chegada dos cavalos a vapor a essa linda e pitoresca terra do nosso amado Minho. Creio que devêssemos estar em meados do século XX quando a objetiva a captou. Mais ano menos ano, seria por esses tempos, tempos em que ainda se vislumbravam os matos cortados para forrar a cama dos animais, tempo esse em que se valorizava o transporte ferroviário. No dia 15 de julho de 1913 deu-se a abertura à exploração do troço da Linha do Minho entre Valença do Minho e Lapela, e aos 15 de junho de 1915 deu-se a abertura à exploração do troço entre Lapela e Monção. Os comboios circularam naquele ramal cerca de 75 anos. Há cerca de 33 anos que o transporte ferroviário foi decapitado naquelas bandas, mais concretamente no último quartel do século passado, em 1989. A Linha do Minho podia ser percorrida do Porto até Monção, mas, quisera a vontade dos homens que passasse a terminar em Valença do Minho, qual disparate qual quê? Uma verdadeira atrocidade contra o progresso, digna dos nossos decisores políticos, tão pródigos em produzir miséria. Hoje, correm atrás do prejuízo, lembrando-se que a ferrovia além de fundamental é um meio premente para mitigar as consequências nefastas que imputamos à natureza. Mas, enfim, cabe-nos a nós castigar os prevaricadores na hora das Eleições. Todavia, o povo português não sabe escolher, se tiver um cesto de maçãs podres à venda, compra as que estiverem menos podres, ao invés de as rejeitar e exigir outras em substituição. Mas, isso são outras estórias, contudo, é difícil resistir e não comentar as aberrações que testemunhamos na nossa querida pátria. O que importa é evocar a velha Ponte, Obra de Arte da nossa Arqueologia Industrial, gémea de uma outra mais a jusante do rio Minho, em Friestas (concelho de Valença), que atravessa o rio Manco, ou Furna, como é conhecido. A foz do rio Gadanha é um local soberbo, tão soberbo que a velha Ponte se funde com a paisagem bucólica, entre o sussurrar das águas que se misturam, o verde de esperança que veste o local, o cantar dos pássaros, as lendas mouras e outras estórias que emergem na nossa imaginação, tão naturais nesse éden que Deus e o Homem criaram. Hodiernamente, as duas Pontes gémeas integram a Ecopista do rio Minho, pelo que quem as quiser apreciar com melhor detalhe basta percorrer uma das mais belas paisagens de Portugal. Não obstante, tratarem-se de duas pequenas Pontes, a verdade é que sem elas a ligação ferroviária não teria sido realizada com tanto arrojo, como aquele que a arquitetura do ferro nos pôde oferecer. Ambas as Pontes medem cerca de 20 metros de comprimento, por pouco mais de 5 de largura, estando assentes em apoios de alvenaria aparelhada. O material de que são feitas as Pontes gémeas é o ferro pudlado, com recurso a rebites e escassos parafusos para fixação das partes. Na presente imagem vislumbra-se o que parece ser um moinho ou azenha, engenhos esses que predominaram na paisagem portuguesa desde tempos imemoriais, para moer os cereais, como o milho, aos quais acudiam as pessoas, constituindo-se como locais de sociabilização. Portugal foi ao longo de séculos predominantemente rural. O povo encontrava na agricultura o seu principal empregador – os comboios contribuíram para a mudança gradual de paradigma – oferecendo empregos sobremaneira diversos. Abria-se um mundo novo de oportunidades, no complexo e vital mundo ferroviário.

A terminar, sugiro que a autarquia de Valença do Minho e a autarquia de Monção realizem um esforço no sentido de promover essas duas preciosidades, quiçá, incorporando-as nas Rotas do Património Industrial Ferroviário – tão maltratado em muitos casos – sob pena de se tornarem banais, como parte de uma famigerada ecopista, que ditou o fim do progresso naquelas paragens. Não fossem os autarcas locais de então permitir um ultraje daquela dimensão, próprio de filhos bastardos, para quem a pátria não passa de madrasta, e Monção seria atualmente uma terra muito mais próspera, repleta de oportunidades.