Carros lendários voltam a encantar no Minho 

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Ainda agora acabou, mas já deixa saudades. Foram três dias de um desfile histórico notável, que reuniu quase uma centena de alguns dos mais marcantes carros de ralis de todos os tempos. O fantástico Lancia Delta S4 que foi guiado oficialmente por Henri Toivonen é talvez a mais impressionante figura de cartaz, mas outros Lancia, como Rally 037 e Delta HF Integrale, o Peugeot 205 Turbo 16, os Opel Manta e Ascona 400, os Toyota Corolla WRC ex-TTE e Celica Turbo ou ainda os «poderosos» Audi Sport Quattro S1 E2 são apenas alguns dos exemplos de carros que deixaram uma marca indelével na história do Campeonato do Mundo de Ralis.

 

Mas o passado dos ralis portugueses também está muito bem representado, através, por exemplo, de réplicas perfeitas do Peugeot 306 Maxi e do Renault Mégane Maxi das equipas oficiais, que travaram dos mais empolgantes duelos nos Campeonatos Nacionais dos idos de 1990, ou do Mitsubishi Lancer Evo3 com que Rui Madeira conquistou a Taça do Mundo FIA de Grupo N, em 1995 – guiado pelo próprio piloto, que continua a exibir as qualidades que fizeram dele um dos nossos melhores.

 

Enfim, muitos cavalos de potência, memória e sobretudo História são as marcas principais do RallySpirit e o conceito essencial dos Rally Legends do exclusivo circuito Slowly Sideways Europe a que pertence. A prova da X Racing organizada desportivamente pelo Clube Automóvel de Santo Tirso é tudo isto, mas foi igualmente qualidade competitiva ao longo das 10 especiais cronometradas da edição deste ano – a Boucles de Barcelos é uma classificativa espetáculo.

 

O público agradeceu, acorrendo em grande número aos troços, enchendo sempre o parque de assistência de Barcelos e marcando forte presença nos reagrupamentos de Amares, Vila Verde, Barcelos e Santo Tirso, e ainda no controlo de passagem de Famalicão. A assistência remota à moda antiga (na berma da estrada), em Mixões da Serra, Vila Verde, foi uma das novidades na edição deste ano, mas um dos momentos mais marcantes do contacto com o público foi sem dúvida a festa ao pôr do sol no Jardim das Sobreiras, na marginal portuense junto à foz do Rio Douro, que encantou os milhares de pessoas que por lá passaram.

 

Gil nos Históricos e Costa nos Spirit

No plano competitivo, José Gil e João Andrade, no bonito e bem preparado Ford Escort MK1, lideraram de início a fim entre os Históricos, com um ritmo que fica bem patenteado pela vantagem de 4m23.6s com que se impôs ao segundo classificado, Rui Salgado/Luís Godinho, em VW Golf II GTI. Herculano Santos Pereira e Miguel Castro (Opel Kadett GT/E) encerraram o pódio, já a 8m16.7s do vencedor.

 

“A prova começou calminha, fomos aumentando o ritmo, o carro portou-se lindamente e não tivemos qualquer tipo de problema. Foi bom, divertimo-nos. Depois, quando vimos que estávamos muito à frente nos Clássicos, tentámos lutar pela classificação geral absoluta e conseguimos. Fomos mais rápidos do que o vencedor dos Spirit. Quanto ao carro, é um Escort de 1975, com motor BDG de 240 cavalos, um carro muito fiável e que dá muito gozo conduzir. Já agora, em 1980, fiz dois ralis com o pai do João (Andrade, o navegador), vencemos, e agora fiz com o filho. Gostava de dedicar esta vitória ao pai do João, ao Joca”, disse José Gil no final.

 

Entre os Spirit, Armando Costa e José Costa, em Mitsubishi Lancer Evo6, também exerceram grande domínio, mesmo se Rui Madeira liderou nas duas primeiras especiais. Foi então que Costa assumiu o comando, para não mais o perder, cimentando progressivamente a vantagem até aos 52.0s finais sobre os segundos classificados, Guilherme Outeiro e Eduardo Outeiro, em BMW E30. O último degrau do pódio foi ocupado pela dupla João Pedro Peixoto/Leandro Parreira, em Renault Clio 16V, a 3m09.7s do mais rápido.

 

Armando Costa era um piloto naturalmente satisfeito no final: “Foi difícil, porque o rali foi longo e muito desafiante, mas os objetivos foram cumpridos. O principal era a diversão e foi amplamente cumprido. Correu tudo bem, um carro cinco estrelas, um ambiente fantástico… tudo cinco estrelas. Impecável. O mais difícil foi sexta-feira, com as classificativas novas, particularmente Vila Verde, que foi muito desafiante. Mas correu tudo bem, conseguimos alguma vantagem e deu para gerir nos restantes dias”.

 

Rui Madeira protagonizou excelente recuperação

A prova foi também marcada por alguns percalços entre os participantes. Ainda na sexta-feira, o Alpine Renault A110 de Hugo Reis e Diana Assunção deu um toque, na sequência de uma falha de travões no carro. Os danos cingiram-se quase exclusivamente à fibra da carroçaria, que após um aturado trabalho de «reconstrução» com fita adesiva lhes permitiu prosseguirem, logo no sábado, ao abrigo do Super Rally.

 

Pedro Gastão Silva e Sérgio Paiva também participaram, sábado, sob o regulamento do Super Rali, depois de a correia do alternador do Ford Escort MK1 se ter soltado logo de manhã. Foi trabalhoso, mas conseguiram resolver o problema, não sem que, todavia, tivessem penalizado por excesso, daí o Super Rally. O pior aconteceu mais tarde, quando um despiste os forçou ao abandono definitivo.

 

Também na sexta-feira, logo a abrir a prova, na primeira especial, Mário Neto e Miguel Costa não evitaram uma batida numa rocha que produziu danos irreparáveis a tempo no bonito Datsun SSS 1800. Rui Madeira e Paula Madeira foram outros dos que tiveram de adotar o Super Rally. Uma falha de travões após a penúltima especial de sexta-feira obrigou a reparação prolongada. O almadense ainda completou o troço e chegou a constar na segunda posição após a 1.ª Etapa, mas o excesso de penalização acabaria por ditar o abandono no dia. Foi, todavia, protagonista de uma excelente recuperação ao longo do resto do rali e ainda conseguiu chegar à sexta posição entre os Spirit.

 

Referência igualmente para o abandono inglório da dupla Edgar Botelho Moniz/Ivo Machado, no belo Volvo PV 544 amarelo, cuja caixa cedeu na última especial cronometrada (Barcelos Norte). Jorge Rodrigues e Luís Duarte, no Datsun 1200, abandonaram após um ligeiro toque, na seguinte, e «sorte» idêntica teve a dupla Paulo Silva/Sandra Fonseca, quando, ao dar espetáculo para o público, não evitou um toque com uma roda do BMW E30 num passeio, que lhe abriu a direção.

 

Agora que o RallySpirit 2023 terminou, Pedro Ortigão, um dos responsáveis da X-Racing, não esconde a satisfação por mais um balanço positivo, mas já está focado em elevar ainda mais a fasquia para o próximo ano: “Tudo correu na perfeição. Estamos empenhados em consolidar o rali internacionalmente e penso que, este ano, como resultado desse esforço feito ao longo destas oito edições, conseguimos a melhor lista de inscritos de todos os tempos, principalmente em termos da qualidade dos carros presentes. Portanto, o balanço é muito positivo. Aliás, quando vemos pilotos que fazem as provas de referência a nível mundial a chegarem ao fim tão satisfeitos como chegaram e a dizerem que para o ano estarão cá e que vão dizer aos amigos para também virem a Portugal, esse é o melhor feedback que um organizador pode ter. E uma motivação para pensar no futuro e continuar a evoluir”.

 

Razões de sobra para se elevarem também as expetativas para a nona edição do Rally Spirit, em 2024.

 

Classificação 

 

Históricos

1.º José Gil/João Andrade (Ford Escort MK1), 56m17.4s

2.º Rui Salgado/Luís Godinho (VW Golf II GTI), 4m23.6s

3.º Herculano Santos Pereira/Miguel Castro (Opel Kadett GT/E), 8m16.7s

 

Spirit

1.º Armando Costa/José Costa (Mitsubishi Lancer Evo6), 56m26.0s

2.º Guilherme Outeiro/Eduardo Outeiro (BMW E30), a 52.0s

3.º João Pedro Peixoto/Leandro Parreira (Renault Clio 16V), a 3m09.7s