“Cortejo Histórico das Feiras Novas é um workshop em directo de teatro e uma lição de história”

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O período anterior e posterior à fundação de Ponte de Lima marcou o cortejo histórico das Feiras Novas que, durante pouco mais de uma hora, desfilou pelas ruas da vila com centenas de pessoas a assistir. A representação dos nove quadros históricos, que começou no casamento de D. Henrique com D. Teresa e acabou com a atribuição do foral a Ponte de Lima, esteve a cargo de 12 grupos de teatro e associações do concelho.

Quase 30 elementos do grupo de teatro DuplaFace representaram o quadro sobre o momento em que D. Afonso Henriques foi armado cavaleiro. “Este cortejo é sempre muito rico e o facto de contar com as associações acaba por envolver toda a população”, reconheceu Susana Luciano, do DuplaFace, que participou vestida de nobre. “Este cortejo é uma lição de história e o Miguel Franco, que escreve o guião, tem feito um trabalho exímio de investigação. No nosso caso, vamos vestidos de nobres, por isso, a orientação que recebemos é que não podemos manifestar muita alegria no cortejo. É por isso que fazer de pessoas do povo é mais vantajoso porque podemos dançar… é caso para dizer que mais vale ser pobre”, gracejou. Paulo Vieira foi o cavaleiro que representou D. Afonso Henriques. Em cima do cavalo Tornado, Paulo admitiu, entre risos, que sentiu o peso da responsabilidade de representar o primeiro rei de Portugal, principalmente pela cota de malha que trazia na cabeça.

A Associação de Jovens e Amigos de Friastelas representou o banquete medieval e, com um javali (falso) em cima da mesa, os elementos deste grupo garantiram que seriam dos mais animados, principalmente por causa dos bobos da corte. “Para mim, desfilar nas Feiras Novas é uma alegria e um encontro de amigos”, José Lemos, fundador deste grupo, que convenceu um amigo do Porto a vestir-se de nobre e desfilar também. “Participar neste cortejo é muito bonito, relembramos a nossa história e dá para rir porque ver homens de collants é sempre muito giro”, gracejou a presidente desta associação.

Os Pequenos Actores do Lima já estão habituados a participar neste cortejo e, este ano, 28 elementos dos cinco aos 21 anos, representaram a criação dos infantes na Idade Média. “Eles adoram participar neste cortejo que é um workshop em directo de teatro e, acima de tudo, uma lição de história”, realçou Luísa Jorge, presidente deste grupo.

Domingos Morais, presidente do grupo de teatro Gacel, encarnou a personagem de frade Celestino no quadro que representou a luta entre as dioceses de Braga e Santiago de Compostela, antes da fundação de Portugal. Por isso, bispos, cardeais e até o Papa participaram neste quadro do cortejo, que contou ainda com o grupo do Orfeão Limiano, para mostrar “o jogo de poderes” entre o clero e a nobreza. Narciso Pereira já dispensa apresentações no cortejo histórico das Feiras Novas porque é dos limianos mais antigos a participar neste desfile. Depois de ter sido frade e bispo, Narciso, de 74 anos, chegou a Papa e fez de Calisto II. Desde 1985 que Narciso participa neste cortejo com os irmãos e já tem sobrinhos a assumir esse “legado”. “Não posso falhar esta tradição da minha terra”, sintetizou Narciso, um antigo técnico de Farmácia em Ponte de Lima, que veio de Valongo para a festa. Como Papa, Narciso disse que iria pedir aos “fiéis para virem mais vezes a Ponte de Lima para visitar esta terra linda”. José Abreu, de São Martinho da Gandra, foi um estreante neste cortejo. Vestido de monge beneditino, coube-lhe a tarefa de ajudar a seguir o pálio do Papa, mas é junto aos seus animais, que já levou ao concurso pecuário das Feiras Novas, que José se sente mais confortável. “Acho que havendo animais, bandas e concertinas já temos Feiras Novas!”, atirou o “monge”, com uma gargalhada.

O casal Sofia Ribeiro e Fernando Pereira, residentes na freguesia de Fontão, têm sido, desde 2015, os responsáveis por abrir o cortejo. “Acabamos por vir sem muita vontade, mas no fim do cortejo é sempre muito gratificante. Passamos por tanta gente que nos cumprimenta e isso é sempre muito bom”, declarou Sofia Ribeiro. O marido Fernando considerou que o cortejo tem crescido ao longo dos anos. “Cada vez há mais gente interessada em ver este momento da festa. Penso que as pessoas foram passando a palavra, dizendo que o cortejo é muito bem organizado, é interessante e representativo de uma época, por isso, foi ganhando envergadura e estatuto e é um momento em que se pode interpretar a história da nossa terra”, disse.

João Barreiro, limiano de 19 anos que integra no cortejo histórico desde 2010, destacou a importância da participação dos jovens neste ponto do programa das festas. “Depois da noite de sábado é muito pesado para alguns. Eu e os meus colegas chegamos a casa às seis da manhã e também nos custou a acordar, mas o importante é que estamos aqui, como manda a tradição”, gracejou.

ALTO MINHO Nº 1603 – 14 de SETEMBRO DE 2022