“Se para as zonas que sobram forem todos os barcos, vamos acabar com o peixe”

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A secretária de Estado das Pescas admitiu que “algumas áreas da pesca” vão ter “dificuldades em exercer a atividade” se avançar o atual plano para energias renováveis ‘offshore’, mas que a pequena pesca é “menos afetada”.

“O plano [de Afetação para a Exploração de Energias Renováveis ‘Offshore’ – PAER] que está em cima da mesa tem algumas áreas da pesca que vão ter dificuldades em continuar a exercer atividade. Não é a pequena pesca. Do que foi estudado e dos dados que temos, a pequena pesca é menos afetada do que outros segmentos de atividade”, afirmou Teresa Coelho aos jornalistas, à margem do 2.º Congresso da Pequena Pesca, em Vila Praia de Âncora.

A secretária de Estado assinalou que, do primeiro PAER para o atual, que está em consulta pública “até 13 de dezembro”, as áreas “foram afastadas da costa”, pelo que será a “pesca de arrasto” a área “mais afetada” no setor das pescas.

A pequena pesca, o “segmento mais representativo da pesca” nacional, será “menos afetada”.

Questionada sobre críticas de pescadores e armadores ao PAER, Teresa Coelho assinalou ainda que o plano está em consulta pública, pelo que este é o momento para serem apresentados contributos ou introduzir melhorias.

“A versão que está em consulta pública só será definitiva quando a consulta pública terminar. Agora é o ‘timing’ para as entidades darem os seus contributos”, observou.

No entanto, a Associação de Armadores de Pesca do Norte avisou que o setor está disposto a parar para contestar a criação de parques eólicos para a produção de energia renovável ‘offshore’, caso ocupem áreas importantes para os pescadores.

“A guerra [dos pescadores] vai até onde for preciso. Se tivermos que parar, paramos, mesmo antes de as eólicas serem instaladas. Se as eólicas são um desígnio de Portugal, por que razão têm de ser os pescadores a pagar esse desígnio?”, questionou Manuel Marques, presidente da associação.

O responsável referia-se ao Plano de Afetação para a Exploração de Energias Renováveis ‘Offshore’ (PAER), em consulta pública desde segunda-feira, e lembrou que Portugal tem “licenciadas mais de sete mil embarcações e a pequena pesca representa 90%”, pelo que a construção de parques eólicos no mar pode deixar em causa “mais de seis mil embarcações”.

“Se Portugal tem uma Zona Económica Exclusiva [ZEE] tão grande, então que coloquem [os parques eólicos] para fora das 200 milhas. Das 20 milhas para a terra, é onde nós trabalhamos. Só trabalhamos em 5% da ZEE. Se podem colocar as eólicas nos restantes 95%, porque querem colocar as eólicas nos nossos 5%?”, vincou Manuel Marques.

Caso as eólicas ocupem os 5% da ZEE destinados à pesca, estará em causa “uma zona superior aos Açores e à Madeira junta”, o equivalente a “300 mil campos de futebol”, notou o presidente.

“Vamos trabalhar para onde? Se para as zonas que sobram forem todos os barcos, vamos acabar com o peixe. Não queremos meter nenhuma zona em desequilíbrio. Os barcos que tiverem de sair tem de ser cortados e indemnizados”, defendeu.

Para o responsável, os privados não estão interessados em afastar os parques eólicos da costa porque “é mais barato para eles e não se importam com a pesca”.

“Só se vão importar quando começar a faltar o peixe na mesa dos portugueses”, lamentou.

Manuel Marques alertou ainda que mesmo a pequena pesca será afetada pela produção de energia eólica no mar, porque “os cabos vão ter de passar para terra por algum sítio”.

“A pequena pesca pode ser afetada na zona em que passam os cabos. Não se pode trabalhar na zona onde estão os cabos, como acontece em Viana do Castelo [no primeiro parque eólico flutuante da Europa Continental]”, criticou.